A equipa multidisciplinar do ORFEUS pretendeu desde o início obter respostas sobre a existência de uma identidade nos livros usados em Ofício Divino pelas monjas cistercienses de S. Bento de Cástris no período moderno em Portugal, expressa numa dupla perspetiva: a religiosa e um musical, como produtos das orientações do Concílio de Trento e das suas indicações no sentido da uniformidade. A pesquisa na mais extensa coleção de livros dedicados à música (Livros de Coro e manuscritos musicais) de todos os mosteiros de Évora, o mosteiro de S. Bento de Castris, pretendeu analisar o lugar da música na comunidade eborense e o seu papel na educação das monjas, que significava por vezes a presença de membros externos do mosteiro, num período em que a vida no claustro foi tão vigiada.
Em termos codicológicos, paleográficos e iconográficos procedeu-se a uma análise da escrita (identificação de letras maiúsculas e minúsculas) e ornamentação (inicial, letras maiúsculas, outras letras decoradas, motivos decorativos marginais ou intertextuais, marginalia), avaliando também as intervenções posteriores no manuscrito original (revisões, correções, anotações, marcas de uso) e o estado de conservação dos mesmos. Partindo ainda de uma breve abordagem às encadernações (materiais, formato, tipologia), procurou-se ainda entender a história e origem dos Livros de Coro do mosteiro e apreciar a existência de uma estética cisterciense no período pós-Trento. Os códices iluminados cistercienses seguem, com variações, o pensamento de S. Bernardo e as indicações capitulares. No livro, a imagem deve ser entendida como imagem situada quer no que respeita à construção da página, quer na sua relação com o texto ou, na ausência desta relação, com o sentido geral da festa ou tempo litúrgico, quer relativamente aos costumeiros e diferentes ordos litúrgicos.
Quanto à pesquisa histórica, tomando como ponto de partida a importância do Concílio de Trento na vida temporal e espiritual das comunidades femininas, visa verificar: as mudanças litúrgicas no mosteiro de S. Bento de Cástris, especialmente no Ofício Divino, impostas pelo Concílio - unificação dos ritos e rezas, mudando os introitos de algumas festas, mudanças na jerarquia das festas da igreja, subida aos altares de santos novos; verificar o cumprimento das imposições de Alcobaça – assistência ao Coro; proibição de cultos; mudanças no calendário litúrgico; cumprimento do Breviário cisterciense; verificação de formas particulares de devoção; analisar a origem geográfica e social das religiosas e a existência de redes, bem como a relação entre a prática musical e os espaços do mosteiro.
A investigação musicológica destes manuscritos inclui a descrição da sua notação musical e conteúdos litúrgicos, a análise comparativa das melodias, a transcrição em notação moderna, a busca de concordâncias, a reconstrução das práticas de desempenho, e as suas dimensões litúrgica, organológica e técnica.
O estudo de instrumentos musicais usados em Portugal nos períodos da Renascença e do Barroco pode claramente contribuir para as futuras abordagens organológicas no país. A falta de informações sobre o uso de instrumentos musicais em Portugal no contexto religioso, antes do século 18, pode ser explicada por dois acontecimentos históricos. Um deles é o terramoto de 1755, o que contribuiu para o desaparecimento de muitos vestígios artísticas de eras anteriores. O outro está relacionado com a extinção por decreto, em 1834, das ordens religiosas em Portugal. Livros e outros objetos de valor foram então alienados pelo Estado. As informações contidas nos Livros de Coro que chegaram até nós, utilizados por ordens religiosas, podem ser uma boa fonte de informação, quando estudados conjuntamente à luz da musicologia e da organologia. Embora a análise de partituras forneça informações sobre a música, a sua correlação com instrumentos pode elucidar-nos sobre a sua construção e utilização, num contexto nacional e internacional.
O facto de terem permanecido num país católico ajuda a estreitar as variáveis de instrumentos encontrados na música sacra. Ao contrário dos países influenciados pela Reforma, a música de igreja permaneceu mais uniforme em Portugal. Certamente havia algumas influências, como a necessidade das medidas de austeridade resultantes Concílio de Trento confirmam.